Depois da meia-noite, o que vem? - Uma mulher que escreve #59
Quem vai estar lá para te ouvir falar das metas que você não cumpriu?
Edição 59 | por Lethycia Dias
Olá, pessoas que leem!
Como passaram o Ano Novo? Eu sei que já faz 10 dias, mas essa é a primeira edição de 2023, e se eu for me prender a esse tipo de rigor, só vou poder falar do assunto em algum fim/início de ano em que eu não me dê recesso da news.
Então, nessa edição, teremos:
Minha virada de ano;
Minhas metas para 2023;
Uma mini-crônica de Ano Novo.
Nessa época de dezembro a janeiro, a gente começa a pensar em tudo que fez durante o ano que está acabando, avalia se foi bom ou ruim, se realizamos ou não o que dissemos que faríamos 365 dias antes. Tem gente que faz simpatia, gente que escolhe cor de roupa, gente que joga na loteria e gente que não liga pra nada disso porque NADA vai mudar após as 23h59.
E, de fato, nada muda. A noite passa como qualquer outra e o dia amanhece como deve amanhecer. Mas ao mesmo tempo, tudo muda porque a gente faz com que mude. Os calendários acabam e a gente tem que trocar por novos, com os dias do mês reposicionados (e às vezes um dia a mais em fevereiro). As datas nos nossos celulares e computadores são alteradas e a gente passa algumas semanas escrevendo o ano errado por costume. E alguém, em algum momento, decidiu que nessa noite a gente deveria se reunir com pessoas de que gosta, fazer uma comida mais gostosa, estourar fogos, abrir uma garrafa de bebida e desejar ou prometer um monte de coisas que ninguém sabe se um dia serão realidade.
Aqui em casa, a gente entra no clima de forma moderada. Eu e minha mãe jogamos na Mega da Virada porque é legal ficar imaginando o que a gente faria se ganhasse (eu pediria demissão por mensagem no próximo dia útil). Não acreditamos de verdade que a cor da roupa vai fazer alguma diferença, mas a gente veste um branco aqui, um verde ali, porque mal não vai fazer. Mas se tem uma coisa que a gente acredita é que a casa deve ser limpa e as coisas velhas devem ser jogadas fora. Por isso eu quase sempre reorganizo minha estante em dezembro: Deus me livre de virar o ano deixando meus livros no estado de caos que eles ficam ao longo dos meses.
Mas o fim do ano também me deixa melancólica. Talvez pela comparação que sempre fazemos entre aquilo que queríamos e o que tivemos; ou por ser a época em que eu reencontro pessoas da minha família que vejo muito pouco - às vezes, só nessa ocasião. E é também quando me lembro dos fins-de-ano passados e me pergunto: por que eu acho que não realizei “nenhum” objetivo? Por que essa pessoa mudou tanto e agora é tão difícil conversar com ela? Por que não estou feliz igual no Natal de dois mil e bolinha, quando eu ainda era criança?
Meu fim de 2022 foi em casa com a minha mãe, assistindo o Show da Virada na TV e sem poder ao menos beber alguma coisa pra ficar alegre. Bebida alcoólica e antidepressivo não combinam. Só nós duas, sem festa, sem visita, sem decoração especial, com sono, com a janta que deu pra fazer correndo e cansadas de tentar acalmar uma gata apavorada. Eu ainda remoía a raiva por minha mãe quase ter passado a noite num hospital, trabalhando aos cuidados de uma mulher idosa cujos filhos só estão esperando a “mamãe” morrer. E o fato de ela ter conseguido estar ali não era o suficiente pra mim, porque ela quase não esteve. E eu não sei como uma pessoa pode ser tão mesquinha a ponto de negar a alguém o direito de festejar no último dia do ano.
Mas em meio à tristeza e amargura que eu sentia, havia também determinação. Expectativa. Vontade.
Um ano novo começaria, e finalmente daríamos um fim ao governo fascista que causou tanta angústia, revolta e sofrimento nos últimos anos. E eu queria recomeçar. Voltar a escrever. Retomar minha rotina de escrita da madrugada. Voltar a escrever no meu diário. Estudar mais sobre escrita. Fazer mais cursos, ler mais livros teóricos, melhorar meu inglês. Um ano inteiro estava à minha disposição para isso.
Acho que essa é a mágica do Ano Novo, sabe? O tempo passando, mas também se renovando.
E foi nesse espírito que fiz uma lista mental de metas para este ano:
10 coisas para fazer em 2023
Voltar a escrever. Não deixar que a convivência diária com colegas de trabalho golpistas me roube o ânimo de fazer o que eu mais gosto;
Voltar a fazer terapia;
Estudar inglês;
Terminar o conto que comecei a escrever em novembro;Essa está riscada porque foi cumprida hoje.Reestruturar e retomar o meu romance interrompido;
Concluir o romance interrompido;
Publicar uma história nova em junho;
Publicar o romance no segundo semestre;
Manter a newsletter;
Mudar de emprego ou tomar posse como servidora pública.
E eu sei que faz parte da brincadeira não levar a sério as promessas de ano novo, mas minhas metas são as coisas que eu mais quero fazer esse ano. E se eu não cumprir alguma delas, por qualquer que seja o motivo, espero saber ser gentil comigo mesma em dezembro.
Depois da meia-noite, o que vem?
A meia-noite demora, e quem é esperto já está alimentado pelo menos desde as 20h. É bobagem ficar esperando hora certa pra comer. A gente passa o tempo comendo as frutas da época: uma uva, um pêssego, uma ameixa.
As mensagens começam a chegar. Figurinhas, imagens de taças, flores ou serpentinas. A frase do dia. Uma, duas, três, quatro, incontáveis vezes, nos grupos ou chats privados. Quem está com acesso à internet quer mostrar às pessoas que se lembra delas, que deseja coisas boas, que está feliz. Fotos são feitas. A maquiagem, as roupas, os sorrisos. Você espera. O tempo passa devagar.
Depois das onze, as pessoas começam a se aproximar. Falam do que esperam, do que desejam. Prometem, brincam, sorriem. Tudo será esquecido em alguns dias, mas talvez, daqui a um ano, elas se lembrem do que disseram. Talvez deem risada do que não houve.
Faltando quinze minutos, a expectativa cresce. Todo mundo se junta. Alguém te puxa pra perto pra dizer coisas que você não sabe como responder. Você se deixa levar. Fotos. Sorrisos. Alguma explosão antecipada é ouvida de longe. Qual horário vale? O do seu celular, do celular dos seus amigos, da televisão abandonada na sala, ou dos vizinhos na própria comemoração?
E isso importa?
A contagem regressiva começa. Cinco, quatro, três, dois, um. Feliz Ano Novo! Gritos. Risadas. Fogos. Abraços. Alguém abre uma garrafa que espirra em todos porque foi sacudida de propósito. Felicitações, feliz [insira o número do ano], eu te amo. Mais abraços, mais sorrisos, vídeos, fotos, fogos, olha o céu que bonito. Começam a cantar sem ritmo, alguém dá risada, você se diverte. Até que.
As mensagens param de chegar, as frutas acabam, as pessoas vão embora. Da bebida só resta o que ficou no fundo das taças abandonadas*. Silêncio. E agora?
Todos te ouviram falar dos seus sonhos, suas metas. Alguns vão te dar os parabéns se você vier a realizar uma ou outra. Mas quem vai estar do seu lado para te ouvir falar das metas que você não cumpriu?
*Este texto foi inspirado pela canção New Year’s Day, de Taylor Swift.
O que li, ouvi e assisti
Em dezembro, li um monte de histórias temáticas de Natal. Entre elas, destaco O Filho da Noite Estrelada, de Juan Jullian, que é uma espécie de releitura de Um conto de Natal do Charles Dickens, mas é também MUITO MAIS que isso. Nessa versão moderna, visitamos o passado, o presente e o possível futuro da jovem atriz Bárbara, e quem nos leva nessa viagem é nada mais nada menos que uma entidade do candomblé e da umbanda chamada Zé Pelintra. Quando li a palavra “Saravá” (o cumprimento utilizado por quem pratica religiões de matriz africana), fiquei arrepiada. E eu amei como o conto representa uma fé tão marginalizada e ao mesmo tempo tão brasileira ao invés da moralidade cristã da história clássica.
Também no fim de dezembro, encontrei o meu quinto favorito do ano. Se a casa 8 falasse é um slice of life narrado por uma casa (sim, uma casa) e conta as histórias de três famílias que viveram no mesmo espaço em três décadas diferentes, de 1999 a 2020. Li a segunda metade desse livro em apenas um dia, dei muita risada com as piadas e opiniões da casa, me apaixonei pelos personagens e amei ver todos eles se encontrando no final.
Meus outros favoritos do ano foram, em ordem de leitura: Heartstopper, O peso do pássaro morto, Torto Arado e Blackout: O amor também brilha no escuro.
O podcast 30:MIN teve dois episódios muito bons: É bom ter metas de leitura? discute sobre porque nós leitores nos cobramos ler quantidades absurdas de livros, se faz sentido fazer isso, se é possível fazer sem ansiedade, e outras formas de estabelecer metas. E Por que ler Milton Nascimento? aborda as intercessões entre música e literatura a partir da obra de Milton. Não preciso nem dizer que amei, né?
Ao longo de dezembro, assisti a 4ª temporada de The Handmaids Tale quase inteira. Só faltou o último episódio. Fiquei surpresa em ver que FINALMENTE a June saiu de Gilead ao invés de dar a chance para outra(s) pessoa(s). Estou vendo pelo Globoplay e pensando em como os streamings me deixaram preguiçosa: quando essa série foi lançada, não havia previsão de transmissão no Brasil, mas por três anos eu fui atrás de três temporadas pelos *meios alternativos*, episódio por episódio, legenda por legenda. Hoje, estou considerando esperar que a quinta temporada chegue ao serviço da Globo, por mais que a navegação dele seja ruim.
Meu último filme de 2022 foi Barbarian, que me deixou PENSANDO MUITO, e eu sei que muita gente detestou a segunda metade do filme, mas eu gostei dele inteiro. Pra quem quiser ver, está no Star+ e certamente também nos meios-alternativos-plus.
Ainda não assisti NADA novo em 2022, porque ser concurseira às vezes me deixa sem fins de semana. Tenho certeza de que quando abrir a Netflix de novo, vou lamentar pelos filmes da minha lista que foram removidos antes que eu pudesse ver. É a vida.
Obs.: Não vou comentar sobre os terroristas e a barbárie que fizeram em Brasília no fim de semana. Espero que aqueles que os financiam sejam identificados e presos assim como os que praticaram essas ações. Mas não vou deixar essa gente horrível pautar o que escrevo num espaço que deveria ser livre e confortável. Trabalhar com gente que defende isso já é estressante demais pra mim.
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Eu fico por aqui.
Um abraço,
Lethycia.
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