Levantar e seguir em frente - Uma mulher que escreve #55
Levamos um baque, mas vamos levantar e seguir em frente. Os efeitos de lançar um livro trabalhando 6 dias por semana em pleno processo eleitoral e a expectativa para continuar.
Por Lethycia Dias | Edição 55
Olá, pessoas que leem!
São 9 horas da manhã de quarta-feira e eu não sei o que escrever aqui.
No fim de semana, que é quando eu deveria preparar as edições da news em condições ideais, eu imaginava uma edição empolgada, cheia de novidades; mas logo na manhã de domingo, vi que a ansiedade e as emoções à flor da pele trazidas pelo processo eleitoral não me permitiram escrever nada.
Depois, na segunda, pensei em fazer uma edição mais séria, um textão sobre como a literatura e toda forma de arte é política porque tudo é político e reafirmar meu posicionamento que, eu espero, vocês possam deduzir a partir dos meus livros, mas que estou declarando todos os dias lá no Twitter.
Mas alguma coisa me fez estagnar, ficar paralisada, sem saber o que fazer. Acho que foi o choque de perceber que, mesmo depois quatro anos com o país sendo governado por um fascista ignorante que a cada dia faz declarações abjetas, comete crimes de responsabilidade, envergonha o país diante de autoridades estrangeiras e internacionais, ameaça adversários e antigos aliados políticos, ofende pessoas e trabalha ativamente para piorar as condições de vida do povo de seu próprio país, as coisas seriam diferentes dessa vez. A rejeição apontada nas pesquisas eleitorais seria fortemente motivada pelo preço alto da gasolina e dos alimentos básicos no supermercado, pela falta de emprego formal, pela indignação diante da sabotagem na compra de vacinas e pelo deboche às centenas de milhares de mortes durante a pandemia.
Como pessoa ingênua que sou, eu esperava o melhor do brasileiro - mesmo aquele brasileiro que tinha sido bem babaca no passado - e vi que o Brasil permanece sendo esse país cruel, preocupado só com o próprio umbigo, incomodado que as pessoas ao lado tenham a mínima melhoria de vida, determinado a atacar e destruir tudo que considera indesejável. E indesejáveis são todas as pessoas como eu: minorias. Mulheres. Artistas. Negros. Indígenas. Pobres. De esquerda. Não-cristãos. Fora da cis-heteronormatividade. "Fora daqui, vão embora!", eles dizem, o tempo todo.
Acho que o que me deixou sem palavras foi perceber que um número de pessoas ainda maior do que quatro anos atrás é assim. Parece que está fora de moda ser minimamente humano. Empático. Achar que todos têm direito a uma vida digna. E a sensação fica ainda pior sabendo que pessoas do meu lado, pra quem eu dou "bom dia" todos os dias, acham que o mundo seria melhor sem pessoas como eu.
Rumo à exaustão
Duas semanas atrás, quando revelei aqui a capa de Antes que as dores te sufoquem antecipadamente, eu achei que hoje voltaria cheia de coisas incríveis pra contar sobre o lançamento.
A realidade é que lançar um livro menos de um mês depois de ter finalizado o primeiro rascunho, enquanto você trabalha de segunda a sábado num lugar onde precisa se policiar para não ter trejeitos que denunciem sua sexualidade e se esforçar para omitir suas opiniões sobre qualquer assunto polêmico (especialmente as eleições) não é nada fácil.
Eu fiz piada com isso algumas semanas atrás, mas a verdade é que, para ter paz nesse lugar, todos os dias eu me tranco no armário e jogo a chave fora. Cada um sobrevive como pode.
Durante todo o mês de setembro, eu fiz a campanha de divulgação de Antes que as dores te sufoquem temendo ser desmascarada. Temendo que alguém no meu trabalho, onde as pessoas são abertamente LGBTfóbicas, tivesse a curiosidade de procurar pelo meu Instagram, onde encontraria tudo que eu tentava esconder em horário comercial.
Por isso não postei nenhuma foto fazendo o L, como todos os meus amigos pessoais e colegas escritores vinham fazendo. Eu temia passar a ser pressionada. Temia perder o emprego, que nem é lá essas coisas, mas é tão necessário quanto o meu anterior. Mas meus posicionamentos, as coisas em que acredito e que defendo, estão nos meus livros, estão nas minhas atitudes no dia-a-dia, e estão declaradas explicitamente na rede social em que não preciso me preocupar com colegas de trabalho ou parentes.
E mesmo assim, eu prossegui divulgando um livro que representava perigo.
Mas, na noite em que Antes que as dores te sufoquem foi oficialmente lançado - porque a Amazon disponibilizou o e-book no mesmo dia em que enviei o arquivo - eu já estava exausta. Cansada de fazer posts em quatro redes sociais diferentes. Cansada de precisar estar online para responder comentários e tweets. Cansada de atualizar os relatórios do KDP e do Amazon Associados. Cansada de esperar pelos posts de parceiros e publieditoriais. Cansada de demonstrar empolgação - embora eu estivesse mesmo empolgada. Cansada de fazer tudo.
Foi por isso que, no final de semana logo após o lançamento (dias 24 e 25 de setembro), fiquei meio off, só respondendo comentários e compartilhando publicações em que era marcada. Estava curtindo um descanso merecido em Caldas Novas, no interior de Goiás, com pouco acesso à internet e muitas piscinas de água quente para aproveitar. Na semana seguinte, retomei as divulgações num ritmo mais lento, e desde então, é como estou tentando continuar.
Não sei se é possível um lançamento não ser cansativo, mas espero fazer as coisas com mais calma na próxima vez.
Salve na agenda!
Na semana passada, uma coisa incrível aconteceu: fui convidada para participar do O texto & o tempo, um evento online para quem lê e quem escreve newsletters. Esse convite só rolou por causa de Uma mulher que escreve, esse espaço que começou como uma forma de promover o meu livro Elas Falam Por Si e se tornou um tipo de contato mais íntimo entre a gente. Sinal de que não estou falando só bobagem nesses quase dois anos.
O texto & o tempo acontece nos dias 5 e 6 de novembro pelo aplicativo Zoom, e as chamadas infelizmente não ficarão salvas para serem vistas depois. Minha participação será no dia 5 (um sábado), a partir das 16h, na mesa Newsletter Fantástika: como promover o trabalho de ficção com newsletters, junto com Felipe Castilho, Eric Novello e Carol Chiovatto, com mediação de Ligia Colares. Confira a programação completa.
O evento é pago, com ingressos de R$ 48,00 válidos para acesso pelos dois dias, e tem vagas sociais gratuitas para pessoas portadoras de necessidades especiais, jovens de baixa renda e pessoas não-brancas, que devem ter seus ingressos solicitados pelo e-mail otextoeotempo@gmail.com.
Eu sei que ta foda pagar as contas e ainda tentar se divertir um pouquinho, mas se você gosta do meu trabalho ou se você gosta do formato newsletter, se escreve uma ou acompanha as de outras pessoas além da minha, inscreva-se e participe! Vai ter muita coisa bacana além da mesa em que vou estar, incluindo várias oficinas interessantes!
E agora que eu já fiz o anúncio formal e dei as informações importantes...
Me deixem surtar!
Estou na programação oficial de um evento com várias pessoas que eu admiro por causa do meu trabalho! Vocês têm noção de como isso é incrível?
O que li, ouvi e assisti
Não dei atualizações sobre o que ando consumindo na edição passada porque achei que isso não cabia na empolgação da revelação de capa.
No meio de setembro, terminei de ler [In]contadas e comecei a ler Conectadas, de Clara Alves. Ainda estou lendo O Xangô de Baker Street e encarando como uma fanfic de Sherlock Holmes em universo alternativo - que no caso, é o Brasil do Segundo Reinado. Assim fica bem mais divertido.
Segui meu planejamento de focar em livros com protagonismo bissexual, e ao longo do mês, li vários livros com essa caraterística. São eles: Cinco mil explicações, de Nick Nagari, Azedo, de Nina Melga, Sempre estive aqui, de Amanda Or, Mais que um drink, de Brenda Zulp, Quando o Sol Voltar, de Olívia Pilar e Melodia Imperfeita, de Henri B. Neto. Este último foi uma experiência incrível pra mim! Eu amo o bom-humor e os jovens adultos com crises internas das histórias do Henri, e não só me vi muito na frustração do protagonista com a ideia de "sucesso" que se espera da vida adulta, como também adorei tudo que o Henri criou para sustentar a dupla fictícia de cantores Johnny & Lia, inspirada em Sandy & Junior, que seu protagonista deseja tanto ver ao vivo. Nenhum dos livros foi resenhado no meu Instagram, mas quase todos eles já têm avaliação minha na Amazon, no Skoob e no Goodreads, se quiserem conferir o que achei.
Outra leitura desse mês de setembro, que me divertiu e surpreendeu bastante, foi O que os vampiros fazem no sol, de Helena Callado. É um enemies to lovers sáfico entre vampira e lobisomem - POR QUE não temos um feminino pra isso??? - e eu me diverti MUITO vendo as duas se odiarem no início da história e me surpreendi pra caramba com o que faz as duas trabalharem juntas e se aproximarem ao longo da história.
E para não esquecer de citar, também li um livro curto de não ficção, que foi o ensaio Ebisteme, de Marília Moschkovich.
Terminei de ouvir a playlist de versões BR de músicas gringas e comecei a ouvir uma playlist que nasceu de um tweet viral, e pior, foi feita de forma colaborativa. as mais românticas do twitter tem a proposta de reunir as músicas que seus colaboradores consideram as mais românticas da música brasileira, mas incluem algumas pérolas incluídas por zueira, como um episódio do podcast O Assunto, do G1; uma escolha questionável, como a música Paisagem da Janela; e o maior bait da MPB, que me faz dar gostosas gargalhadas: bem no início da lista está Como eu quero, do Kid Abelha, que DEFINITIVAMENTE não é uma canção apaixonada. Eu já contei que me divirto ouvindo playlists feitas por outras pessoas? É por causa disso!
Assisti a pouca coisa nos últimos dias por falta de tempo, mas finalmente pude ver a O Homem do Norte, que estava me deixando curiosa desde que estreou, e As boas maneiras, um filme de horror brasileiro que estava na minha lista da Netflix há pelo menos um ano.
Um pedido
Eu chorei de desespero numa noite de domingo, quatro anos atrás, quando vi que uma política de ódio e morte tinha vencido as eleições. E achei que choraria de alegria e alívio este ano, ainda no primeiro turno. Foi um baque ver que não atingimos o resultado esperado no dia 02, mas, por mais frustrante que tenha sido, nós temos algumas coisas a comemorar:
Lula saiu na frente com 48,4% dos votos válidos e 6 milhões de votos a mais do que Bolsonaro. Somos a maioria. Podemos vencer, só vai levar mais um tempo. No dia 30 podemos dar um fim aos horrores que aconteceram nos últimos quatro anos, podemos dizer que é inaceitável governar com ódio.
Então, se você votou no Lula no primeiro turno, vamos levantar e acreditar que podemos ganhar no segundo; e se você votou em outro candidato, mas não quer que Bolsonaro continue, vamos juntos. É só apertar 13 e confirma para acabar com isso. No dia 30, precisamos nos unir contra o inaceitável. E eu acredito que vamos!
É com esse pedido que fico por aqui!
Um abraço,
Lethycia