Tudo sobre a Bienal - Uma mulher que escreve #49
Como foi trabalhar na Bienal do Livro - e o que vem por aí a partir de agora.
Por Lethycia Dias | Edição 49
Olá, pessoas que leem!
Na última edição da news, falei bastante sobre a proximidade da Bienal do Livro de São Paulo e sobre como me encontrar por lá. Hoje, volto para contar um pouco como foi essa experiência.
Uma energia incrível
Preciso começar contando que eventos literários, na Região Centro-Oeste, são raros e pequenos. O único em que costumo ir é a feira e-cêntrica aqui em Goiânia, que tem uma vibe bem diferente da Bienal. Então, mesmo que eu já tenha estado na Bienal de São Paulo em 2018, tudo ainda parecia uma grande novidade pra mim!
Ver, abraçar, tirar foto e falar com escritores era uma coisa impensável pra mim alguns anos atrás. Do dia 02 até o dia 10, eu tive a chance de fazer isso com pessoas que não apenas costumo ler, como também considero amigas e por quem tenho muita admiração. Pedi vários autógrafos e algumas dessas pessoas escreveram coisas lindas que me fizeram chorar. Sério!
A Bienal é também um evento caótico. É gente correndo pra pegar senha pra autógrafo, é gente chorando e passando mal pra ver um famoso, é estar andando por um corredor e dar de cara com alguém que você conhece da internet. Sem falar nas filas enormes pra tudo, desde a entrada até os banheiros. E nos corredores lotados a ponto de você precisar andar devagarinho, tomando cuidado pra não perder suas coisas ou se perder dos seus amigos, achando que não vai conseguir chegar a lugar nenhum. Então foi muito, muito, mas muito cansativo, principalmente pra mim, que passava o dia inteiro por lá.
Mas a parte mais interessante disso é que a energia é contagiante. Estar perto de tantas pessoas que trabalham com livros sempre foi um sonho pra mim, e isso me deixou muito motivada para escrever. Eu tenho proximidade virtual com muitas pessoas, mas falar cara a cara é uma coisa única e passa uma energia muito boa! Eu voltei para casa disposta a fazer uma coisa que só vinha adiando nos últimos meses: escrever. E isso, pra mim, foi a coisa mais preciosa que ganhei enquanto estive lá.
Encontros
Eu queria ver todo mundo. Todo mundo mesmo! E, seja por combinado ou por acaso, acabei encontrando pessoas do mundinho literário que me trouxeram muito mais afeto do que eu poderia imaginar. Autores que eu leio, criadores de conteúdo e pessoas que trabalham em outras áreas do mercado que eu nem sabia que me conheciam. Ouvir "Eu te admiro" é surpreendente.
Na imagem abaixo, estão apenas algumas das fotos que tirei desses encontros. Postei quase todas nos meus stories e também nessa thread no Twitter e ainda vou postar tudo no feed do Instagram ao longo dos próximos dias.
De cima para baixo e da esquerda para a direita, estou junto com: Valter Hugo Mãe, Olívia Pilar, Solaine Chioro, Pedro Bandeira, Tomi Adeyemi, Pedro Rhuas, Juan Jullian, Clara Alves, Lázaro Ramos, Babi Dewet e Marina Feijóo.
Alguns desses encontros foram tipo: "Meu Deus, você existe de verdade!". Com Lázaro Ramos, foi "Eu cresci vendo você na televisão!", e com Pedro Bandeira, foi "Eu cresci lendo seus livros!". Não sei nem como descrever o que é encontrar uma pessoa cuja arte você consumiu durante a vida inteira.
Parte dessas interações só foi possível por causa do meu trabalho, que facilitava bastante o acesso a autores e outras personalidades convidadas pela Bienal. Uma das minhas funções, por exemplo, era receber essas pessoas me identificando como parte da organização e entregar credenciais oficias a elas, então, se eu sentia que havia abertura para isso, às vezes me identificava e falava o quanto eu admirava aquela pessoa.
Cheguei a fazer isso em inglês, mesmo não sendo fluente no idioma e sentindo muita insegurança com isso. Quando Tomi Adeyemi chegou, acompanhada por pessoas de sua editora, ela parecia tão empolgada que eu disse "Hi! Welcome to Brazil!" sem pensar duas vezes, e mais tarde pedi "Can we take a pic?". E foi assim que consegui uma selfie com ela.
Levei uma cadernetinha para coletar autógrafos e foi a melhor ideia que tive, porque eu queria ver um monte de pessoas e não podia levar um monte de livros - sem falar nos escritores independentes que só têm livro publicado em formato digital. Achei que a melhor forma de resolver o problema era levando uma coisa pequena e leve, e foi mesmo. Eu conseguia colocar a caderneta dentro do envelope plástico da credencial, e assim, podia perguntar "Me dá um autógrafo?" nas horas mais inesperadas.
Meu trabalho
Por estar envolvida na organização, eu tinha acesso a espaços privados e passava a maior parte do tempo na Direção do Evento ou circulando de lá até a Arena Cultural e o Salão de Ideias, onde aconteciam as mesas da programação oficial e algumas das sessões de autógrafos.
Nesses lugares, eu fazia e entregava credenciais, recebia convidados, dava instruções, acompanhava pessoas até os lugares onde tinham compromissos, dava informações sobre onde ficavam certos estandes ou os banheiros mais próximos, etc. Cheguei até mesmo a organizar fila de autógrafos, anotando os nomes das pessoas em post-its para facilitar a vida dos autores que iriam assinar.
Uma parte do trabalho para a qual eu não estava preparada era ter que lidar com pessoas. Em especial, pessoas muito ansiosas e empolgadas com a possibilidade de ver alguém. Cheguei a ficar muito ansiosa com isso, tive medo de as coisas darem errado e de eu estar estragando tudo.
Mas conforme os dias foram passando, fui me habituando, pegando o jeito e tudo foi dando certo. Havia outras pessoas trabalhando junto comigo, então a gente se ajuvada entre as dificuldades. Foi exaustivo, porém maravilhoso. No domingo (10), quando fui me despedir de algumas dessas pessoas antes de pegar um carro para o aeroporto, eu só sabia chorar.
"Aceitam marcadores de página?"
Uma das minhas expectativas era poder me apresentar e falar das minhas histórias para pessoas novas. Divulgar nosso trabalho na internet deixa a impressão de que já alcançamos todo mundo que pode se interessar pelo que fazemos, mas isso não é verdade.
Eu já tinha tido uma amostra disso quando deixei Mesmo que eu vá embora de graça no fim do mês passado, porque mesmo após quase 3 anos de publicação, o e-book ainda teve mais de mil downloads. E quando eu comecei a distribuir meus marcadores na Bienal e ver quantas pessoas ainda não conheciam, eu passei a compreender isso melhor.
As redes sociais criam bolhas, e a não ser que algum post seu tenha um engajamento orgânico muito bom, dificilmente os algoritmos serão generosos com você. É difícil alcançar gente nova, e estou tentando fazer isso há algum tempo. Durante os últimos dias, eu fiz isso. Apresentei meus livros para gente que nunca tinha visto antes, que falava que iria pesquisar para ler. Não sei se vão mesmo, mas fiquei feliz em ouvir.
No começo, eu estava com vergonha. Sou tímida e tenho dificuldade para falar com pessoas que não conheço. Depois, fiquei com medo de religiosos e conservadores. Medo de oferecer o marcador de Mesmo que eu vá embora para a pessoa errada e sofrer agressões verbais e/ou físicas. Medo de entregar os marcadores para adolescentes e deixar os pais irritados. Essa é uma preocupação constante para quem escreve livros LGBT.
Mas desenvolvi uma estratégia: eu procurava por pessoas jovens que usassem adereços da comunidade LGBT ou por casais de meninas que estivessem andando de mãos dadas (e havia muitas pessoas assim)! E quando oferecia, via a empolgação no olhar das pessoas. Muitas delas elogiavam, falando que as capas eram lindas. Isso fez com que eu me sentisse acolhida, segura e esperançosa. E deixou a determinação de fazer com que meus livros sejam mais vistos fora da internet. Já estou com planos para a Bienal de Brasília, que se aproxima, e para outros eventos locais.
Perrengues
Nem tudo foram flores. Desde antes da minha ida, passei por algumas situações que foram preocupantes na hora e que se tornaram histórias boas para contar.
Começando com a viagem de avião. Já viajei assim antes, mas foi há tanto tempo que na vez anterior, o despacho de bagagem ainda era de graça. Então eu basicamente não sabia como economizar espaço viajando com uma mala pequena para economizar dinheiro. Eu nem tinha mala pequena! Só consegui comprar a mais barata que encontrei poucos dias antes de viajar.
Carreguei um monte de roupas de frio, preocupada com os alertas sobre variação de temperatura ao longo do dia, e não precisei de boa parte do que levei. Só na véspera da viagem eu pensei em colocar os meus cosméticos em frascos pequenos, porque estava pensando em levar shampoo, condicionador, creme de pele e de cabelo do jeito de comprei - eu achava que precisava de grandes quantidades para nove dias, mas levei aproximadamente 100 ml de cada produto e todos sobraram.
Escolhi meu hotel pela localização (perto do Expo Center Norte) e pelo valor (baixo), então tive alguns problemas com chuveiro ruim e com barulhos da rua e da recepção. E por ser naturalmente ansiosa, eu tive poucas noites de sono realmente boas. Houve dias em que, se ficasse parada muito tempo, poderia dormir a qualquer momento. Estou em casa desde a madrugada de segunda e, para falar a verdade, ainda estou cansada.
Atualizações
Resumindo tudo, foi uma experiência muito boa. Foi a melhor oportunidade profissional que eu já tive - falei isso pra muitas pessoas - e também a realização de um sonho. Mal acabou e já estou morrendo de saudades e torcendo para poder ir também para a Bienal do Rio e para outras edições da de São Paulo.
Agora estou novamente sem emprego e sem freela, então eu devo me concentrar em procurar outra fonte de renda para quando o seguro-desemprego acabar. Talvez eu volte a oferecer serviços de leitura crítica e sensível. Talvez eu volte a enviar currículos. Com certeza continuarei estudando para concursos públicos. Talvez eu seja convocada por algum. Consegui fazer uma reserva para os próximos meses, então vou esperar para ver o que acontece.
Não assisti praticamente nada novo desde a edição anterior e também não terminei os livros que tinha começado antes de viajar. Estou lendo Allegro em Hip-Hop, O beijo do rio e Torto Arado, mas talvez eu interrompa essas leituras para ler dois livros que descobri recentemente e que têm temáticas parecidas com meu projeto de escrita atual. Eles são Açúcar queimado, de Avni Doshi, e Aprender a falar com as plantas, de Marta Orriols. Ambos estão custando SÓ 4 REAIS no formato digital!
Sabem o conto novo que eu tinha parado de escrever em fevereiro? Escrevi 700 palavras nele enquanto viajava e voltei para casa com muita vontade de continuar. De qualquer forma, eu precisaria terminar, porque tenho um prazo para cumprir, mas agora estou motivada. Espero na próxima edição poder dizer que voltei de fato a escrever essa história.
Isso foi um pouco do que eu tinha para contar e espero que tenham gostado de saber.
Um abraço,
Lethycia