Mulheres que incomodam - Uma mulher que escreve #63
Livros com mulheres fazendo tudo o que nos disseram que não deveríamos fazer.
Edição nº 63
Olá, pessoas que leem!
Uma feliz coinciência fez com que a edição desta quinzena caísse exatamente no Dia Internacional da Mulher. E como estou fazendo no meu Instagram uma série de conteúdos focados nessa data — com direito até a post de “Não queremos flores”, resolvi trazer o tema também pra cá.
Assim, a news de hoje vai ser no formato de lista de indicações. Abaixo vocês encontram livros com mulheres fazendo tudo o que nos disseram que não podíamos, como: querer autonomia; estudar uma área de conhecimento não ligada ao cuidado; querer ser amada, ao invés de objetificada; usar a própria voz; não se identificar com o papel imposto da maternidade; exercer a própria sexualidade e ter prazer com ela; desempenhar um papel de liderança; ou fazer parte da História.
Tem livro recente, livro de uns anos atrás, livro brasileiro e livro gringo, de diversos gêneros literários.
Lembrando que não posso enviar links afiliados por aqui, mas você pode adquirir qualquer um desses livros garantindo uma pequena comissão pra mim a partir do meu linktree ou abrindo a versão web desta edição, no topo do e-mail.
Começando pela leitura mais recente…
O guia da donzela para anáguas e pirataria, de Mackenzi Lee
Mencionei esse livro em edições anteriores da news, mas acabei nem fazendo um novo comentário quando terminei de ler. É um romance de época que faz parte de uma trilogia, mas pode ser lido de forma independente do seu antecessor. Nele, você pensa que vai acompanhar a protagonista em busca de uma oportunidade para estudar Medicina (no século XVIII, quando mulheres nem frequentavam universidades), mas acaba indo parar numa aventura que envolve ambição, eurocentrismo, colonialismo e conflitos morais e éticos envolvidos na ciência, com alguns elementos fantásticos. Junto da protagonista-narradora estão mais duas mulheres que assim como ela, também desejam a própria independência, cada uma à sua maneira.
Boa noite, de Pam Gonçalves
Boa noite é um romance young adult brasileiro sobre assédio e violência sexual em ambientes universitários, que até hoje são dois crimes bastante subnotificados, acobertados ou tratados como “caso isolado”. Demora um tempo para entrar de vez no assunto, mas faz isso de forma bem responsável. Além disso, a protagonista estuda Engenharia da Computação e é uma das quatro mulheres de sua turma, que a todo mundo são subestimadas por professores e colegas. Juntas, elas decidem criar um aplicativo para ajudar outras garotas a se protegerem no campus e em festas.
Recomendo a preferência pelo e-book, porque o livro físico foi impresso numa fonte pequenininha que quase me fez desistir de ler.
Cierzo e Meus fantasmas dançam no silêncio, de Nádia Camuça
Temos aqui uma indicação dupla de poesia.
Os poemas de Cierzo falam abertamente da sexualidade feminina (cis-heterossexual), tanto para celebrar o prazer quanto para questionar os padrões impostos à mulher cis-hétero em relação ao sexo. O livro é composto também por fotos da própria autora em um ensaio que oferece, junto com o texto, uma experiência imersiva.
Já Meus fantasmas dançam no silêncio, o primeiro livro de Nádia, aborda o silencionamento de mulheres de forma geral, especialmente no que diz respeito à escrita, com influência clara de Virginia Woolf e Sylvia Plath. O tema da sexualidade e do prazer da mulher que encontramos em Cierzo começa aqui.
Ambos estão com a edição física esgotada - o que é uma pena, porque as fotos de Cierzo são a coisa mais linda - mas têm e-book na Amazon e disponível no Kindle Unlimited. Além disso, a Nádia é dona de um dos perfis que mais gosto de acompanhar no Instagram.
O Irlandês, de Tayana Alvez
Parece uma típica comédia romântica entre uma babá e um pai solo rico e bonitão, mas a mocinha desse livro não teve muita escolha sobre ser independente: ela sempre precisou se virar sozinha porque nenhum cara com quem se relacionou antes queria assumi-la como namorada. Foi assim que ela acabou se tornando intercambista na Irlanda e se dividindo entre três empregos, e quando começa a rolar um clima com o homem pra quem ela trabalha, ela fica com o pé atrás porque sabe que isso tem tudo pra dar errado. A autora não usa meias-palavras para falar de solidão da mulher negra através de uma protagonista que não aceita ser apenas um fetiche de homem branco.
A Poeta X, de Elizabeth Acevedo
Trouxe mais um pouco de poesia aqui, mas dessa vez de forma romanceada.
Esse livro é como se tivéssemos acesso ao caderno onde Xiomara (leia Siomara) escreve em forma de poema tudo aquilo que não tem coragem de dizer. Entre a rigidez de sua família, os assédios constantes que sofre e o conforto que encontra em um clube de poesia, ela acaba encontrando a coragem de usar a própria voz quando tudo o que lhe dizem é que ela deve se calar.
Eu fui uma adolescente bem parecida com ela, no sentido de ter muito a dizer e nenhuma vontade de falar, então queria ter lido esse livro quando tinha a mesma idade de Xiomara.
A filha primitiva, de Vanessa Passos
Em uma narrativa crua e direta, Vanessa Passos nos dá socos no estômago com uma história de avó, mãe e filha marcadas por abandono e abusos. A narradora tenta atender o desejo da mãe de ascensão social por meio do estudo enquanto preenche as lacunas da própria vida com a escrita. Mãe de mais uma criança que não tem a presença do pai — assim como ela mesma também foi uma filha de pai desconhecido — ela rejeita a maternidade que se espera dela e não tem pudor para falar disso.
Esse livro foi o vencedor da 6ª edição do Prêmio Kindle e uma das minhas melhores leituras de 2021.
O prazer é meu, de Melina Navarro
Uma coletânea de contos eróticos com protagonismo lésbico, em várias situações e possibilidades diferentes, escritos para mulheres que se relacionam com mulheres a partir do olhar de uma autora que conhece essa experiência.
Eu sou muito a favor da produção de conteúdos sexualmente explícitos feitos por e para pessoas LGBTQIAP+, porque a gente não precisa se envergonhar de nada e nem ficar tentando agradar uma sociedade heteronormativa. E acho que não há nada que incomode mais do que mulheres explorando a própria sexualidade sem ser para servir a um olhar curioso e/ou misógino.
A edição física desse livro está disponível no site da Editora Vira Letra, e a digital está na Amazon e no Kindle Unlimited.
Aída: um conto de liberdade, de Mariana Ribeiro
Nesta ficção de época, acompanhamos Aída, uma mulher negra que nasceu livre, foi escravizada na infância e nunca se cansou de lutar pela própria liberdade. Por isso, ela lidera uma rebelião dos escravizados da fazenda em que vive —, que, apesar de malsucedida, nos lembra de que a escravidão não foi aceita passivamente. Essa história trabalha muito bem com relações de poder e contesta o protagonismo de homens brancos nas lutas abolicionistas.
Heroínas negras brasileiras, de Jarid Arraes
Esse é um livro que eu faço questão de indicar sempre que posso. Acho que deveria ser lido em escolas, cobrado em vestibulares, porque a História que aprendi me ensinou que pessoas negras só tiveram no Brasil o papel de escravizadas, mas depois descobri os nomes e histórias de tantos homens e mulheres negros que tiveram importância em diversas áreas. Aqui, Jarid Arraes nos conta por meio da poesia de cordel as vidas de 15 mulheres negras brasileiras fizeram História.
Elas Falam Por Si, de Lethycia Dias
Aproveito o espaço para indicar meu próprio livro. Nele, narro as trajetórias de cinco escritoras contemporâneas que falam de sua paixão pela escrita, das próprias obras e do cenário da literatura brasileira, com muitas críticas à forma como a mulher escritora ainda é vista nesse meio e também à falta de oportunidades para artistas que estão fora do Eixo Rio-São Paulo.
Esse livro (meu único de não ficção) é muito especial pra mim, e essa newsletter nasceu por causa dele. Quando eu estava lançando Elas Falam Por Si, em 2020, eu tinha muita informação sobre ele que não cabia nos formatos das redes sociais, mas que achava que podia ser interessante para os meus leitores, então decidi finalmente ter uma newsletter. As primeiras edições de Uma mulher que escreve foram escritas para promover EFPS, e sem ele, eu não sei se teria começado isso aqui.
O que li, ouvi e assisti
Entre várias leituras que foram só ok, da última edição até aqui eu destaco dois títulos. Estudo sobre magia e cristais, de May Barros, é um conto de roadtrip com uma princesa, uma fada e uma necromante que vão tentar cumprir uma missão importante para o reino em que vivem. Tem protagonismo assexual e arromântico e as três personagens são muito fofas!
Já Eu vejo Kate é tudo menos fofo e eu devorei tão rápido quanto na primeira leitura, e embora eu fosse me lembrando dos próximos acontecimentos conforme ia avançando na história, ainda foi difícil e doloroso de ler. É um livro do tipo que te faz querer continuar sem parar, mas também é duro e brutal (eu não sei se realmente é necessário dizer isso sobre um livro de serial killers), e agora estou com vontade de ler todos os outros livros da Cláudia Lemes que eu já tenho. Deixo aqui o aviso de conteúdo para misoginia, violência contra mulheres, violência sexual e descrições extremamente gráficas de sangue e cadáveres.
No momento, estou lendo: Leah fora de sintonia, de Backy Albertalli; Eu vejo Kate - A Lua do Assassino, de Cláudia Lemes; e O homem vazio, de Thiago Lee.
Andei ouvindo o último álbum da Lana Del Rey, o Blue Banisters, o último (até agora, já que um novo deve ser lançado no dia 10) da Miley Cyrus, o Plastic Hearts, e o Aurora, o álbum de Daisy Jones And The Six — uma banda que só existe no universo ficcional do livro que leva seu nome, mas agora tem álbum no Spotify graças à adaptação para série do Prime Vídeo, que foi lançada na última sexta-feira e eu ainda não comecei a assistir. Eu AMO a confusão que isso gera!
Continuo assistindo os indicados ao Oscar, intercalando com outros filmes que precisava ver antes de perder o acesso a eles. É o caso da assinatura promocional de 3 meses da Mubi que estou usando, porque lá assisti a Pride (ou Orgulho e Esperança, em português), um filme ambientado nos anos 80 e inspirado em fatos que trata da curiosa decisão de um grupo de ativistas gays e lésbicas de Londres que resolvem apoiar uma greve de mineiros. O mundo era outro e os mineiros ficam literalmente com vergonha de receber esse apoio, mas o desenvolvimento me surpreendeu muito.
Peço desculpas por comentar aqui um filme que acabou de ser removido de um streaming, mas eu soube que Anna Karenina sairia da Netflix no dia 28, então corri pra ver, e eu não sei como vivi TANTO TEMPO sem ter assistido esse filme antes. É uma obra de arte, intenso do início ao fim e visualmente lindo! Vi alguns comentários de parece teatral, e eu amei isso, porque os cenários são montados e desmontados diante dos personagens no início e no fim, e eu entendi como mensagem clara de que o casamento e a vida em sociedade não passam de teatro porque são uma grande farsa! Fiquei morrendo de vontade de reler o livro.
Um aviso
A Semana do Consumidor da Amazon se aproxima (tudo indica que será do dia 13 ao dia 20 de março), e como muita coisa fica realmente barata e todo mundo fica mais predisposto a comprar nessas datas, eu venho aqui lembrar vocês de colaborarem comigo usando os meus links nas suas compras. Cada compra feita com meu link me dá uma comissão que ajuda a complementar minha renda.
Eu fico por aqui.
Um abraço,
Lethycia
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