Você é o que você consome? - Uma mulher que escreve #61
Como a gente escolhe o que ler, ouvir e assistir hoje em dia.
Edição nº 61
Toda vez que olho pra minha estante, eu me deparo com meu maior pesadelo dos últimos anos: os livros que comprei anos atrás de forma impulsiva, num ritmo maior do que conseguia ler, e ainda não foram lidos.
Nos anos de 2015 e 2016, eu estava descobrindo o mundo dos influenciadores literários e passando a participar de grupos de leitores no Facebook, assistir a vídeos-resenha no YouTube, seguir bookstagrammers que tinham estantes enormes cheias de livros e Funko Pops de seus personagens favoritos. Como alguém que tinha passado boa parte da vida escolhendo entre o acervo das bibliotecas de colégios públicos ou desejando ler os romances vendidos em edição econômica no final da revista Avon, aquele novo mundo parecia incrível pra mim.
Logo entrei numa pira de comprar livros pela internet me baseando apenas num vídeo legal, numa foto bonita ou num simples post sobre promoção ou cupom de desconto. O resultado disso foi ver minha pequena coleção crescer rápido demais e ficar cheia de livros que, algum tempo depois, eu já nem lembrava por que haviam me interessado. Gostei de ter lido alguns desses livros; outros, eu terminei de ler com a sensação de ter perdido meu tempo. Na última vez que reoorganizei minha estante, separei para vender um box inteiro ainda no plástico porque percebi que aqueles livros já não me interessavam mais.
Hoje, sou mais cuidadosa com as minhas compras de livros. Leio sinopse, avaliações, resenhas… Penso se gosto mesmo daquele gênero ou tropo, se aquele tema ou estilo de narrativa conversa comigo. Penso se o dinheiro gasto naquela “comprinha” não vai fazer falta pra outra coisa. Penso se não estou apenas me deixando influenciar pela empolgação de outra pessoa.
É curioso que uma das profissões que surgiram na última década com o crescimento do acesso à internet e a popularização das redes sociais tenha recebido o nome de influenciador. Pessoas que, conectadas à rede por um computador ou celular, em uma rede social ou plataforma de entretenimento específico, compartilham seus gostos pessoais, suas opiniões, suas referências ou escolhas, e com isso, têm o poder de influenciar o comportamento dos consumidores em potencial de uma marca ou produto. “Usando o meu cupom no carrinho, você ganha 10% de desconto!”
Não estou escrevendo para criticar quem trabalha com isso ou quem acompanha alguém na internet. Eu mesma já tive um blog literário, tentei ter um canal no YouTube, postei resenhas de livros no Instagram. E dizer “se você gostou dessa dica de leitura, compre o livro na Amazon pelo meu link” nada mais é do que influenciar alguém a consumir o mesmo que eu.
É que me peguei pensando no quanto a dica, a recomendação se tornaram importantes pra gente depois que passamos a estar conectados o tempo todo.
Toda vez que abro a página de um livro na Amazon, o algoritmo do site me recomenda livros semelhantes; o meu Kindle faz o mesmo quando está conectado à internet. Muitos autores hoje em dia divulgam os próprios livros com posts do tipo “Se você gostou disso, também pode gostar disso”. A Netflix deixa seus conteúdos mais consumidos em destaque num ranking com grandes números: 1, 2, 3… O Spotify cria playlists diárias ou semanais com base naquilo que você já gosta de ouvir.
Chega uma hora que a gente se pergunta: eu estou lendo/ouvindo/assistindo isso porque gosto mesmo ou só porque está no hype, porque “ta todo mundo falando”, porque está na lista dos mais ouvidos, porque se não assistir logo vou receber spoiler, porque a Fulaninha de Tal disse que foi um dos favoritos dela?
Por favor, não comece a pensar no seu comentário raivoso sobre como você conhece bem o seu próprio gosto e escolhe por conta própria como se divertir. Não estou te acusando disso. Estou me questionando se é possível saber se a gente decide por si mesmo ou se alguém decide pela gente. Será que ainda é possível decidir sozinho?
Eu me lembro de uma coisa que fazia com mais frequência quando era estudante. Pelo menos uma vez por mês, saía cedo da aula, almoçava no RU assim que ele abria e pegava um ônibus em direção ao centro para poder assistir a um filme no Cine Ritz, um cinema de rua que tem tudo que eu, como estudante, precisava: ingresso barato. Com carteirinha, eu pedia meia entrada e pagava mais barato ainda. E às vezes, quando chegava muito cedo para a sessão, descia a Rua 8 em direção à Rua 4 e passava o tempo dentro de algum sebo, olhando lombadas, abrindo exemplares e lendo a sinopse ou as primeiras páginas de algum livro. Ali, me sentia descobrindo tesouros. Encontrava livros antigos, do tipo clássico famoso ou contemporâneo que-não-está-na-onda-do-momento, e às vezes, quando percebia que valia a pena, comprava alguma coisa.
Claro que essa decisão era influenciada por tudo que já li antes. As vezes, me interessava por um livro porque seu título era citado em outro livro que já li. Ou então eu já sabia que esse autor trabalhava com essa temática e aquela autora escrevia muito bem sobre aquele outro assunto. E nenhuma dessas informações apareceu sozinha na minha cabeça: eu li ou ouvi em algum lugar antes. Será que, entre as estantes de um sebo, eu escolhia por conta própria?
Sobre escrita
Não cheguei a comentar antes, mas no início de janeiro, terminei de escrever uma história que estava em andamento desde novembro, embora seja bem curta. Não posso dar nenhum detalhe a mais por enquanto, além de avisar que será a publicação de junho prevista nesse post do meu Instagram.
Nos últimos dias, tenho me juntado com colegas de escrita em longas chamadas de vídeo para lermos nossas produções de um projeto em comum - do qual essa minha história faz parte - e a sensação de ver o que estamos construindo em conjunto, somada à expectativa dessa publicação, foi um dos melhores sentimentos que tive nos últimos tempos.
Estou sem emprego novamente, e o meu plano para os próximos três meses é estudar para minhas próximas provas enquanto espero pelas resultados das últimas que fiz. Eu tenho como me manter durante esse período, mas toda ajuda é bem-vinda, então, se você for comprar qualquer coisa na Amazon… já sabe. Aqui você tem acesso ao meu Linktree, onde pode clicar no meu link afiliado. Comprar meus livros ou ler pelo Kindle Unlimited também ajuda.
Ainda estou readptando minha rotina, mas em algum momento daqui até maio, eu devo fazer mais um curso de escrita (que já está comprado e pago) e reestruturar meu romance interrompido desde o ano passado.
O que li, ouvi e assisti
Do dia 26 até aqui, concluí uma leitura muito interessante. Identidade, de Nella Larsen, é um romance ambientado nos Estados Unidos dos anos 1920 e gira em torno do reencontro entre duas mulheres negras de pele clara que conseguem se passar por brancas. Irene Redfield, a narradora, só faz isso ocasionamente e se orgulha de suas origens. Clare Kendry, ao contrário, casou-se com um homem branco racista e apagou qualquer vestígio de seu passado em troca de uma vida luxuosa e confortável. O título é certeiro: durante a leitura, pensamos muito se o ato de se passar por outro é uma simples omissão ou uma renúncia àquilo que você é. Afinal, é possível abrir mão de uma parte de você mesmo e fingir que ela não existe?
Estou lendo, ao mesmo tempo, Boa noite, de Pam Gonçalves, Dias de abandono, de Elena Ferrante, e O guia da donzela para anáguas e pirataria, de Mackenzi Lee. Continuação indireta de O guia do cavalheiro para o vício e a virtude, esse romance acompanha a jornada de uma jovem determinada a se tornar médica numa época em que mulheres sequer tinham direito a educação formal.
Essa semana, ouvi o álbum Ana Cañas Canta Belchior (Ao Vivo) e fiquei apaixonada. Ana Cañas dá uma interpretação bem diferente às canções mais conhecidas de Belchior - que eu adoro - e essa é a primeira vez que eu gosto mais de um ao vivo do que da versão de estúdio.
O episódio 149 do podcast Modus Operandi traz uma ótima entrevista com Daniela Arbex, autora do livro Todo dia a mesma noite, que inspirou a série ficcional da Netflix e a série documental do Globoplay, ambas de mesmo nome, sobre a tragédia da Boate Kiss. Daniela é uma das jornalistas brasileiras que eu mais admiro, e no episódio, fala não só de como acompanhou as pessoas afetadas pelo incêndio (entre sobreviventes, parentes de vítimas e pessoas que trabalharam no resgate e atendimento médico), como também de seu trabalho pesquisando e escrevendo sobre outros traumas que o Brasil insiste em empurrar para debaixo do tapete - e eu tenho o autógrafo dela!
Quanto ao que estou assistindo, essa é a hora de fazer um mea culpa: as minhas prioridades sobre quais filmes assistir mudaram completamente no dia 24 de janeiro, quando foram anunciados os indicados ao Oscar de 2023. Desde então, estou concentrada em assistir aos filmes da premiação aos quais tenho acesso, seja por streaming ou por outros meios.
Dou destaque para The Fabelmans, o novo do Spieberg, baseado na própria infância dele. Em geral eu acho chato o gênero “Filmes Sobre Cinema”, mas adorei esse! Também fiquei encantada com O menino, a toupeira, a raposa e o cavalo, um curta animado sobre amizade inesperada e encontrar um lar pelo caminho.
Eu fico por aqui.
Um abraço,
Lethycia
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